domingo, 5 de julho de 2009

Abuso de drogas legais assombra legado de Michael Jackson

É como uma mina em céu aberto: de repente, toda a gente quer falar dos abusos farmacêuticos de Michael Jackson. Assistentes que trabalharam para o ídolo confirmam que, por vezes, não o conseguiam sequer acordar, tal era a carga de sedativos ingeridos ou injectados. Se intervinham e diziam que começavam a estar preocupados, Jackson gritava com eles e acusava-os de interferência na vida privada.

Multiplicam-se as surpresas. O Los Angeles Times confirma que Diprivan, a medicação da multinacional anglo-sueca AstraZeneca usada nas anestesias, foi encontrada nos aposentos privados da residência onde o cantor faleceu. E, noutra frente, há inúmeros consultórios em Los Angeles onde toda a gente sabia que, mesmo quando Jackson só precisava de uma recarga botox ou outra qualquer intervenção médica menor, exigia sempre anestesia. E alguns antigos médicos vêm agora afirmar que o cantor os pressionava constantemente com pedidos pouco razoáveis de medicação indutora do sono profundo.

Tanto assim que o procurador geral da Califórnia garantiu que as autoridades vão partir à caça de todos os médicos que, passando receitas sem olhar a códigos deontológicos, alimentaram o vício, por fim fatal, do cantor. De um instante para o outro parece que sempre foi do domínio público isto de o Michael Jackson ter-se tornado dependente de medicação análgésica super hard core e só sentir-se feliz quando, voluntariamente, ficava inconsciente.

Por todo o lado, o retrato que emerge é só um: Jackson já se tinha tornado dependente há pelo menos 10 anos, o espírito dele mantinha-se deprimido após ter sido acusado de abuso sexual de menores, devia dinheiro a muita gente, os compromissos comerciais estavam a tornar-se insuportáveis e ele passou a precisar de uma ajuda intravenosa com maior regularidade, ao ponto de já nem sequer se preocupar em manter o seu hábito em segredo.

Um dos antigos colaboradores referiu inclusivamente que Jackson temia pela vida. Tinha medo de ser assassinado, supostamente por causa do valor astronómico do catálogo dos Beatles. Dizia-se invejado. Sendo esta uma estrela que adorava o foco luminoso da atenção geral, não se sabe, neste ponto, onde começava a paranoia e acabavam os factos.

Drama, drama, drama. Não é que seja inesperado, dada a fama do falecido e o estilo espantoso com que pisou o planeta. Mas a sensação que fica é que este drama é apenas o início. Com a divisão do património e a guerrilha familiar pela posse dos filhos, existem forças contraditórias suficientes para despoletar novas polémicas.

Há umas horas, a promotora dos concertos AEG Live assumiu-se confiante que o seguro iria pagar tudo, dada a cláusula no contrato salvaguardando a empresa em caso de morte por overdose. Importa-se de repetir? Pois, para o Michael Jackson foi feita uma apólice rara. Geralmente o seguro cobre acidentes ou causas naturais mas, nesta situação, 1) o promotor já sabia da intensa dependência de Jackson e, 2) a seguradora Lloyd's, de Londres, deve ter enviado um grupo de médicos para avaliar o cantor. A autópsia revelou que Jackson tinha várias picadas nos braços. A Lloyd's não terá visto nada.

À medida que os dias se acumulam, o debate começa a ser sobre a ferocidade com que os média se atiraram à história, o que acaba por ser outra maneira de julgar o cantor. Afinal de contas, quanta atenção é que ele merece agora que já cá não vive?

Primeira hipótese: merece muita atenção, graças às carradas de talento demoníaco que mostrou, por causa da bravura da sua visão que até inclui ter contratado o realizador Martin Scorsese para dirigir um dos seus videoclips, e porque passou 35 anos a fazer parte do quadro americano mais excitante. Segunda hipótese: merece pouca atenção dado que a sua fama, ultimamente, era mais de tablóide do que resultado directo e merecido da sua arte.

A relevância de Jackson na conversa americana corrente é, por vezes, chocante. Talvez esteja aqui, sem deixar dúvidas, a força enorme da sua imagem e presença. Continua a exigir muita paixão. Para já, os escalões sociais de apreciação parecem ser, sobretudo, dois distintos:

1. Topo de gama: Fã incondicional recente que se calhar nem sequer tinha em casa um disco de Michael Jackson mas que, de um instante para o outro, vê no cantor um grito de vitória. Indivíduo geralmente de raça negra. Pode ser o reverendo Jesse Jackson, o mogul Usher ou o actor Tyrese Gibson. Não estão interessados senão em enaltecer publicamente os talentos e as virtudes humanísticas de Michael Jackson.

2. Do contra: Republicanos brancos e pessoas que odeiam a cultura popular contemporânea mais o ênfase maldito que coloca nas vedetas. Para estes, já basta. Já basta de publicitar um produto discográfico que, das plásticas à mudança da cor da pele - isto para já não falar no consumismo aberrante e na certeza, certeza absoluta, que o cantor era pedófilo - constituiu um dos piores exemplos para a juventude. A morte, se foi por excesso de medicação controlada, revela a imaturidade do cantor e a sua total irresponsabilidade como pai e figura de alto perfil que serve de modelo aos admiradores.

No debate sobre a atenção que Michael Jackson merece, há ainda os factos. Os discos dele ocupam 9 dos 10 primeiros lugares da tabela. Nunca se viu nada assim. E a Internet continua inundada com reacções à sua morte, notícias, boatos, fotografias e começos de controvérsia. Não admira que todos os pormenores venham à tona. Vejam bem: até já foi divulgado o tipo de caixão que guaradará o corpo. Custou 25 mil dólares, é todo almofadado por dentro e quase que barroco por fora, como se fosse um Rolls Royce saudita decorado com boa madeira e metal dourado. James Brown foi enterrado num caixão assim parecido.

in "Expsesso"

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